Ali na cama, o suco de nosso sexo escorria de minha mão para suas costas e a vice-versa; esfregava-lhe a fronte dos ombros com força, abraçava-a com quentura e terna adoração. A ebulição de sua pele e o cheiro de ‘te-quero’ do seu pescoço eram, naquele momento particular, o mais delicioso veneno que eu poderia provar enquanto escorria na serpente de sua coluna. As curvas do corpo, estas esquinas delicadas de seu rosto, o jeito empinado que o queixo se jogava à frente de seu pescoço carnudo. O colo maravilhoso, levemente salpicado de algumas pérolinhas de suor, todas danadinhas; sou amante do suspense, minha mão como o olho que vê o filme, apenas se insinua no delicado vale entre seus seios e então sobe em seu ombro onde faz a curva para seu braço leve e esguio – as unhas, no final destes braços, estão pintadas de um rosa apetitoso.
É inevitável não se deixar levar pelo rebolado de sua bunda, como posso deixar de tocá-la se sua própria mão repousava gentilmente em suas nádegas? Não. Ali eu acaricio sempre olhando para seu olho castanho-escuro, pequeno, castanho vivo. Se só observo o seu olho, é na verdade no sorriso que falha ao se conter que me admito a levar a mão para o meio de suas pernas. Não exatamente para dentro de seu sexo – como se eu não quisesse – mas para agarrar-lhe a virilha, no drama. Este leve gemido de quem deseja ser tocada e que sabe muito bem que ali eu desejo tocá-la; ao mesmo tempo, nada acontece nessa fermata do sexo - essa pausa que lhe aparta a distância entre o frugal e o animal. Não resisti um segundo mais que fosse e acariciei seus seios com delicadeza, onde, no fundo, queria lhe apertar com força o alimento dos bicos – como um bebê alto e de pêlos no corpo, apertei-lhe o busto e sorvi o leite de seu prazer ali de seu bico rosa, é como se quanto mais o chupasse, mais louco por ela ficava, como se me alimentasse de fato de profundo desejo.
Mas era uma via de mão dupla, ao passo que seu pescoço não aguentava o peso do seu próprio tesão e sua cabeça pendia, sua boca entreabria, suas cordas vocais gemiam. E a brincadeira da língua é, de certa forma, viciante no corpo desejado, ele começa ali naqueles bicos rosados, ora num, ora noutro, ora naqueloutro, entre eles, ao redor deles e então se apercebemos que estamos dentro do umbigo e sempre descendo. Não é sempre no imediato que testamos o indecifrável sabor do sexo que reside em seu cálice, não, experimentamos primeiro, quem sabe, o agridoce da virilha, o suor das entrecoxas, ou, para aqueles uns, o azedume do peito do pé. Sempre alternando, sempre retornando, mas é tudo uma grande preliminar da preliminar, desde o momento que começamos, talvez o grande prato principal desta entrada é mesmo o beiço do sexo. Entre alguns pêlos, entre alguns lábios, lamber aquele específico ponto é o auge que sua língua pode chegar. Ela se retorce, puxa meu cabelo, tudo parece selvagem e inconsciente demais, o que só me faz a deixar um pouco mais molhada na boceta. Subitamente me sobrevem a sensação de que pouco tempo tem a se perder por ali, e levanto-me a beijar sua boca, dos lábios para os lábios. Ela, ao que parece, parece apartar o sexo. – Espera…
Não consigo, ela mesmo não consegue, suas palavras saem, mas seu corpo pede, entrega, derrete-se, o fremir de suas coxas é tão evidente da necessidade que não há dúvidas no corpo; talvez no ar, mas no sexo do corpo, jamais. A cacofonia dos sentidos confundiu: “Tenho que largar e ver…”
Entrefala e entremão, a dela no meu uso e a minha no seu fecho. Não entendo seu balbucio de recusa, mas no sexo as palavras não são feitas para serem entendidas, mas para serem mordidas pela mão, pelo olhar, pela força da penetração que, ainda, não nos ocorria. Ela apartava e, curada de sua loucura, curou-me da minha, olhou no melhor nos olhos e, enquanto ofegava – e babava pela boceta – falou-me com a franqueza do amor. “Eu tenho AIDS.”
Um tiro na escuridão. Falhou-me forte a respiração. Eu a adorava, disso não havia dúvida alguma, e somente por isso ainda fiquei olhando-a com ternura nos olhos, mas a respiração falhava e se ofegava. Caí para o lado derrotado, amedrontado e acuado como um cão a que apresentam um predador grande demais para enfrentar. Este, no entanto, invisível. Ela, muito mais madura e – eu diria, talvez, acostumada com a situação – segurou minhas mãos, e foi isso que me deu a certeza de que ela sabia que eu sofria com aquilo. Como eu poderia virar, dar-lhe o ‘até depois’ sem que destruísse seu coração já acometido de semelhante doença? Não, não podia. Não se eu a adorava. E ali do lado estava um corpo perfeito, maravilhoso dos pés à cabeça, mas carregando, dentro de si, um demônio, o monstro sedento por novas vítimas sempre. Seus seios delicadamente pousados sobre o travesseiro, sua bunda, jesus que bunda é essa, fazia uma curva tão bem feita para terminar em suas coxas, que eu não pude deixar o asco me tomar o corpo e minha mão pousou nela para acariciá-la. E a mão não parou ali, mas correu seu corpo inteiro, tocou seus bicos rosados, agora já menos endurecidos pelo clima hostil entre ser-humano e demônio. Endureceu, isso sem dúvida, meu próprio pau naquele toque. Olhei fundo naqueles olhos castanhos, onde se lia a morte anunciada, ou apenas onde eu achava que se lia qualquer coisa nos olhos quando, na verdade, a única coisa a ser vista naqueles era a vontade tresloucada da entrega. Cheguei mais perto, como se passado o momento do medo e como se tomado da coragem dos heróis. Abracei seu colo e beijei-lhe a testa.
- Foda-se.
Bruno Portella
| foto de Diógenes Muniz