(… Depois de uns cinco anos eu fui na terapia. Cê acha que é fácil?, não é fácio não. Ma vou confessar: fiquei uns seis meses afastado, só de boa, leléuzinho com a terapeuta, de boa em casa, fazendo compra, curtindo jogo na tevê, recebendo o migué, saindo com os amigos tudo. Nada. E me sentindo sozinho pra cacete. Aquela parada me fazia bem, velhinho. Claro, sempre foi perturbador, principalmente no começo, mas depois cê acostuma. Não sei o que é pior. Não pra se acostumar com aquilo. Lembro que quando caiu o avião ali no Morumbi fui participar do resgate. Era a primeira vez que acontecia algo grande; fazia pouco tempo que eu tava na companhia, nem dois meses. Até então, nada. Nem gato em cima de árvore. Sabe, dessas coisas. Aí fui. Corpo pra tudo que é lado, carbonizados, repartido, foi um pouco chocante. Geral falando comigo, pedindo ajuda, amigo meu me chamando, pedindo mangueira e o cacete. Dava pra ouvir a berraria toda, mas a gente nem se liga. Naquele dia mesmo, eu nem tchum, achei que fosse coisa da loucura toda, das pessoas de fora, imprensa, os curiosos. Hoje sim, quando lembro, sei que para que era, mas no dia – que isso, nem me passou pela cabeça. Foi noutro dia, numa quarta-feira, lembro por que foi num jogo de futebol, de noite. Batidona na avenida assim ó, de frente, matou dos dois lados. Aí foi a gente ajudar quem tava perto, nem era pra gente fazer nada, mas, bombeiro nem sempre tem o que fazer. Então fumo. Aí chegou lá, Leandrinho já foi vomitando de um lado, Biriba tonteou. Nego tava nas ferragem ainda vivo. Quer dizer, vivo vivo não tava. Mas eu achei que tivesse, pedindo ajuda, esperneando, berrando. Nada, tava durão.
Aí que eu saquei né…)
Bruno Portella