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Cozinha da Sobreviência: Sanduba de Atum

A fome não obedece horários. Embora digam que é saudável dominar seu apetite, pôr rédeas de 3 em 3 horas, comer balanceado - não é fácil tarefa. Vivo sob a premissa de comer quando o corpo necessitar - de acordo com a Necessidade, remedando Doris Lessing, lindíssima.

Pois bem, ao sanduíche, portanto. Coisas simples matam aquele desconforto morno do estômago. Sanduíche tem essa simplicidade; essa cumplicidade com o solteiro esfomeado.

Veja que simples; aos ingredientes: duas latas de atum no óleo (sua escolha, eu prefiro), a maionese (eu preferi pela verdadeira), um tapauér receptor e um garfo duro.



O sanduíche de atum, basicamente consiste de uma pasta, que convencionamos chamar de patê - o tal patê de atum. O melhor, pra esse que escreve. A feitura chega a ser zombeteira de tão simples - e dirão alguns: grosseira. Pois bem, aquele que vive sozinho abre mão de certas finuras, não é?

Despeje o atum e espalhe ele pelo tapauér - a experimentação é livre, afinal só você comerá (procure usar os dedos, uma vez que você ainda porá o garfo na verdadeira maionese para o segundo passo). Mas experimente. O atum é de uma iguaria marítima tida como até mais nobre que o salmão no oriente, onde aprendemos a comer os peixes crus. Mas sigamos.


A adição da maionese é crucial - a quantidade também; mas quando se vive sozinho, nota-se a clássica instrução da culinária: a gosto. Ao meu gosto, portanto, bastante maionese.


Aqui o processo mais trabalhoso, manual - escolha em movimentos muito breves e próximos macetar tanto maionese quanto atum formando uma pasta; ou o pavê. Perceba que aqui você dispõe de várias opções; eu prefiro o garfo contra um tapauér, mas há relatos, por exemplo, de velhas virgens pisoteando em grandes porcelanas chinesas.

Esse processo é importante para determinar a consistência de seu pavê - e revela dois erros clássicos de um principiante (ou de qualquer solteiro): o atum com óleo não é uma boa ideia e muita maionese, tampouco. Se você busca uma consistência próxima àquela servida com canapés: reduza a quantidade de maionese, exclua o óleo e adicione duas horas de trabalho a mais para amassar.


Ele tem mais ou menos essa face de massa cinezenta - o que traz todo esse charme cerebral do repasto.

O próximo passo é simples: um pão de forma clássico ou até mesmo o pão de cristo ou francês como sanduíche e uma boa faca que espalhe bem por toda a área (eu uso uma americana, mas qualquer tramontina está valendo). Você que dispõe de folhas (como alface americana, perfeita), não hesite. Rodelas de tomate também são super bem vindas. Mas lembre-se: se você mora sozinho, saladas ou tomates não são compras usuais para você, todos sabemos, e quem tenta, sabe que tudo estraga depois do primeiro uso de tanto desuso. 


E está pronto: o solteiro, alimentado. Posterga por mais quatro horas sua morte iminente (em certas casos, até mais). Até um próximo desafio, com certeza. É importante desenvolver essas habilidades de não preparar o preparado de barriga tranquila, mas a urgência da fome que te faz ser criativo por desespero.

Grande sanduba.


Bruno Portella

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