A adaptação do best-seller Anjos e Demônios é, em uma palavra apenas: ‘divertida’. E diverte-se apenas quem não leu o livro ou um leitor extremamente fácil em fazer concessões (e são várias delas). A história, assim como no livro, trata dos escondidinhos dos Iluminatti que retornam de séculos de desaparecimento para aterrorizar o Vaticano bem no meio da eleição papal.
O filme é divertido, bonito, cenário impecável, ambientações perfeitas, trilha sonora competente, montagem gostosinha, um filme à pampa de se ver.
Mas há um problema, ah se há (quase um palíndromo! uh). Os personagens. Sim. A adaptação de qualquer filme parece requerer alguns ‘ajustes’ para a sétima arte, alguns ajustes que sempre irritam e que raramente encontram um bom tom, sejamos francos. Não é raro comentários do tipo: ‘é, o livro é muito melhor’ e no caso dos Anjos e dos Demônios, amém jesus, fizeram de tudo pra que essa máxima fosse real.
No livro, os personagens todos tem suas motivações para estarem na história e se desenvolverem através dela. No filme, não. É gratuito. A sede por vingança, a paixão entre os protagonistas, a busca pela salvação, pelo perdão, a crença, a confiança – apenas para citar alguns sentimentos motivadores de diversos personagens da trama literária que, por qualquer coisa, desaparecem das telinhas.
E isso, claro, torna insosso alguns personagens como Vittoria Vetra, que no livro desempenha papel incrível em, não somente movimentar a trama para a frente com sua sede por vingança como também motiva Langdon a prosseguir em determinado momento através da relação que nasce entre o casal. Também fode com a vida de Olivetti que, enquanto livro, era um guarda casca-grossa e ambíguo, gerando uma terrível dúvida no leitor e, enquanto filme, se torna um capacho patético de um ‘novo’ Olivetti que, como se não bastasse roubar a sua personalidade, também rouba o papel de Maximilian Kohler, o professor Xavier do CERN (no livro, já que no filme, necas de pitibiriba de velho senil).
E não para por aí, não satisfeito de mexer nos papéis da galera do Vaticano, ainda fazem a pachorra de substituir o, aparentemente, único vilão do livro: Hassassin. O mouro louco, sangue nozóio, pronto pra guerra e feito pra morrer é trocado por um mercenariozinho de merda, branquelo, quatro-olhos bobão que tem a morte mais imbecil de todas no filme. E ainda como se não bastasse substituir personagens por caricaturas pioradas, o filme ainda me troca o último símbolo Illuminatti pra uma dupla de chaves bem idiota no peito do cara – e com qual motivo? Céus, custava manter o diamante Illuminatti (ou algo do tipo)?
Agora, por outro lado, Hanks é sempre fantástico. Sua interpretação nos faz passear tranquilamente pelo filme, mesmo que ele não tenha absolutamente nada a ver com Langdon – fisicamente falando, mas nada que um bom Woody não saiba fazer. Ewan McGregor também perfeito como camerlengo, mas a melhor escalação do filme e de longe é Vittoria Vetra. Idêntica ao livro: italiana boazuda, boas curvas, sensual e forte à sua maneira de morena no coração de Roma – pena, pena, que ela não tá no filme. Aparece aqui e ali, mas não é nem um quinto do que é no livro, melhor seria tê-la cortado do que rebaixá-la à enfeite na tela. Triste, já que sua relação com Langdon é uma das coisas mais gostosas de acompanhar no livro enquanto cresce com os eventos.
Não que o filme seja ruim, longe disso; nem que o filme seja incrível, mais longe ainda . Deve divertir, e talvez nisso não falhe. Mas é complicado ler e perceber que daria pra fazer uma melhor adaptação. Essa desculpinha de que a diferente linguagem da sétima arte justifica algumas adaptações não responde por escolhas absurdas em algumas tramas literárias no cinema. Não é por que muda a linguagem, que a adaptação precisa ser tão inferior (está aí a trilogia do Senhor dos Anéis para provar isso).
A escolha a ser feita, claro, é: você quer fazer um bom filme que valha o seu original escrito ou um filme que valha o investimento do patrocinador? Neste caso, valeu a segunda opção, imagino – não que a trama de Brown seja tão acachapante, mas ele mesmo já escreveu o livro de uma form bem simples e didática para, até mesmo, uma adaptação cinematográfica.
E ainda assim, com uma história fácil, personagens fáceis, trama bem definida, conseguem fazer um filme que, embora divirta quem nunca leu o livro (penso eu, que sim), não faz justiça aos personagens de Brown – não digo tanto de sua pena, já que ele não é nenhum Paulo Coelho (ironia aqui, óquei?). Ou talvez todo esse ranço com o filme, seja pelo simples fato da gostosa da Vittoria mal aparecer na telinha.
Talvez.
Bruno Portella